terça-feira, 9 de outubro de 2012

Da difícil tarefa de ser



As poucas vezes em que aqui escrevi aqui provam que eu não nasci para ter um blog. Sou dispersa, meus pensamentos se escondem nas últimas páginas de cadernos, em folhinhas arrancadas, amassadas e jogadas no lixo, detrás do copo de cerveja...meus pensamentos nem se escondem porque, na verdade, nem acho que eles tenham uma importância que justifique escondê-los.
Não, não é problema de autoestima. Mas venho me dedicando a um projeto individual e do ponto de vista coletivo, o que importa o meu (ou o seu) cotidiano?  Ele tem cores, verdade. É Repleto de ações, e com elas surgem as impressões subjetivas, os sentimentos, as reflexões. 
Estou convencida que é bonito ser pequeno. Fascinante é simplesmente ser. Com isso - nossas impressões sobre o cotidiano, a existência, nossas relação com os outros e com o mundo- se pode preencher uma vida inteira. Mas, no fim das contas, isso realmente basta?
No fundo, sabemos que não. Buscamos em nossas relações o outro porque não existe sentido em viver de si para si. Precisamos da troca. Lembro de um trecho de poema do Charles Baudelaire que nunca mais saiu da minha mente: “Aquilo que os homens chamam Amor é coisa bem pequena, restrita e frágil, se comparada a essa inefável orgia, a essa santa prostituição da alma entregue por inteira, poesia e caridade, ao imprevisto que surge, ao desconhecido que passa".
O individual é maravilhoso e deve ser vivido em sua plenitude. Mas, enquanto eu me preocupo comigo mesma, existe cerca de 1 bilhão de pessoas passando fome no mundo, 70% crianças (dados da FAO). E nunca se produziu tanta comida. Produzimos 30% a mais de alimento do que o necessário para alimentar todas as pessoas do mundo. 
Se pararmos para pensar bem, existe algo muito perverso acontecendo enquanto estudamos, trabalhamos, fazemos amor e nos preocupamos com a viagem do próximo feriado. Cálculo simples: se a população mundial é de 7 bilhões de pessoas, então uma em cada sete pessoas passa fome hoje no mundo.
A vontade de dominar, o poder e o dinheiro criaram uma sociedade doente. As pessoas nunca trabalharam tanto, nunca se mataram tanto para trabalhar (com estresse, enxaqueca, ausências e tudo mais que esse ritmo produz) e a promessa de prosperidade e felicidade não veio. E não falamos sobre isso. Nos iludimos, afinal, pensar dói. Entrega o egoísmo e a falta de sentido e ninguém gosta de lembrar que vive em uma sociedade sem sentido, porque faz refletir sobre o sentido da própria existência.
Minha esperança fica no “outro mundo possível”, citando Galeano, e que está sendo gestado na barriga desse mundo. Fica com as pessoas de alma pura que conheci no meu caminhar. A esperança é uma ingenuidade, mas ela nos move. E é ela que eu busco, porque minha vida está precisando com urgência de um pouco de sentido.











segunda-feira, 25 de julho de 2011

Enamorar

Eu não sei se foi esse clima de mistério e beleza que ronda Buenos Aires. Talvez tenha sido o encanto de algum prédio ou igreja antiga. Quem sabe aquele menino que eu via todos os dias de jaleco branco surrado, pronto para ir à escola de ônibus acompanhado do pai. Ou Porto Madero, com seus edifícios modernos e espelhados, repleto de franquias de Freddo  e Starbucks. A sutileza de um tango de Gardel ou quiçá, um par de olhos qualquer. Não sei bem mas algo me fez querer ficar um pouco mais aqui. 
Essa cidade tem tanto a oferecer  e eu senti que a vivi tão pouco. Se há algo que descobri que quero é Buenos Aires. Buenos Aires com seus contrastes, paradoxos, beleza, miséria, sangue e suor. Quero estar sobre esse céu, falando essa língua, conhecendo essa gente e essa história que se cruza em tantos momentos com a nossa mas de tantos heróis até então desconhecidos para mim.
Essa confusão entre o novo e velho, o tradicional e a quantidade absurda de imigrantes. Essa mescla não seduziu só os meus olhos: seduziu minha alma.
Buenos Aires se tornou minha paixão. Uma dessas paixões de adolescente....dessas que "pode ser roubada",  pela qual se abandona tudo sem olhar para trás, mas que também intuímos que necessitamos  viver, em sua efemeridade. E na sua intensidade.
Em seis meses conheci Buenos Aires. Os próximos são para sentir.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Latinoamericaneando.....

Minha vida em solo hermano revela a cada dia uma descoberta. A maioria delas diferente das que imaginava encontrar. Achei que vivendo aqui estaria imersa na cultura argentina. Veja bem, não é que não esteja, mas a mirada tomou um sentido muito mais latino-americano do que qualquer outro que pudesse ter imaginado. Convivendo com pessoas de tantos países diferentes é natural que o resultado das eleições no Peru cause muito mais frisson em minha pequena comunidade multi-cultural do que o polemizado debate político às vésperas do pleito argentino.
 Aqui essa integração de costumes está presente nas festas no desayunador nas sextas-feiras, onde sempre surge uma bebida étnica (e etílica) diferente para experimentar. Nos almoços em grandes grupos nos domingos, repletos de sabores e tradições que até então eu desconhecia, nos ritmos musicais - algumas vezes de gosto duvidoso - elegidos para bailar.
 As relações em uma república também se tornam muito intensas. O fato de que há um mês você sequer conhecia determinada pessoa se torna totalmente insignificante se você acorda e toma café da manhã, almoça, janta, saí para desbravar a cidade e passa literalmente todo seu tempo livre com ela. E aí dizer adeus pode se tornar uma tarefa muito difícil e as promessas, talvez um tanto ilusórias, de passar férias na casa dela rotineiras. Coleciono convites para conhecer meia latinoamerica - bem quem sabe....vontade não me falta para arrumar a mochila e sair por aí, conhecendo de perto esse continente tão fascinante.
Afinal, tomando as palavras de Belchior emprestadas e fazendo uma pequena licença poética "eu sou apenas uma garota latino-americana sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vinda do interior"



sábado, 9 de abril de 2011

Argentina

Minha saga pela Argentina teve um início maravilhoso: a primeira semana em Buenos Aires contou com a presença das amigas de toda a vida (Emília, Rafela e Nathália) e da minha irmã. Elas ficaram quatro dias e me fizeram percorrer vários pontos turísticos de Buenos Aires, todos lindos. Mas quando elas voltaram pro Brasil a realidade de estar sozinha num país desconhecido e que fala outra língua começou a se firmar. Mesmo estando relativamente perto de casa e manejando com uma certa (relativa, bem relativa) fluência o idioma, coisas como sacar dinheiro com o caixa te dando as opções em espanhol causa um certo temor. Ainda mais se você for tão esperto quanto eu que consegui bloquear o meu cartão (cartão lê-se meu dinheiro e minha sobrevivência...meu arroz, meu pão e minha margarina). Pois é fiz isso. E em pleno carnaval porteño. Me peguei chorando. Dizem que é mal de estrangeiro, nos primeiros dias ficamos muito sensíveis, eu chorava por qualquer besteira. Foi super simples desbloquear o cartão mas bate um medinho de não conseguir, de estar sozinho e quando vês, tu estás  em pânico. Na residencia estudantil onde estou há 4 brasileiras e todas dizem ter passado pelo mesmo.
Aqui eu vivo em contrastes...minha universidade a UADE têm estudantes provenientes da elite argentina,  o bairro onde eu vivo, no sul da cidade, concentra trabalhadores e minha residência é repleta de estrangeiros (colombianos, equatorianos, colombianos, peruanos e chilenos principalmente). Agora imaginem a salada de frutas que é conviver com tantos olhares distintos sobre a realidade.  Como eu amo contrastes e incongruências estou encantada exatamente com o aprendizado que tanta diversidade proporciona.
A elite porteña se assemelha muito a brasileira. Às vezes os comentários burgueses que presencio em minha universidade fazem com que eu tenha a impressão de que não me movi um centímetro e continuo em Caxias do Sul.
Já em meu bairro Barracas chama atenção a impossibilidade de encontrar uma calçada plana. Há degraus para subir e descer a cada 5 metros. O resultado, é claro, são calçadas desertas e pessoas caminhando no meio da rua. Pela manhã cedinho, observo muitos homens indo ao trabalho de ônibus acompanhados dos filhos, que eles deixarão na escola. A naturalidade dessa cena que sempre me toca e demostra o quanto no Brasil estamos distantes de uma relação realmente igualtária entre homens e mulheres. Aqui cuidar dos filhos é uma tarefa que cabe ao casal e os pais cumprem seu papel plenamente.
Mas é na residência onde estou aprendendo mais lições importantes para a minha vida. A arte de cozinhar, de conviver, de compartilhar a vida, de negociar espaços e tempos, de contornar conflitos. Essa está sendo a lição mais produtiva. Viver com pessoas de todas as partes do mundo demostra o muito que temos em comum e o tanto que cada pessoa têm de única. É apaixonante. Voltar já me parece muito mais difícil do que foi chegar. Como dizem por aqui: "a ver".

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

As voltas do relógio

Criei a convicção de que a ignorância de todos trâmites necessários para fazer uma viagem ao exterior é uma benção. Especialmente se a viagem não for de férias e se o país de destino for fã de uma burocracia sem fim, como é o caso da Argentina.
Para los hermanos fazer fronteira com o Brasil, existir grande moblidade entre os cidadãos dos dois países e um acordo de cooperação devido Mercosul de nada valem e não te livrarão de toneladas de papéis. O fato é que é muito menos burocrático provar sua idoneidade para morar na Inglaterra (o visto é só na hora, mas basta apresentar documentos autenticados em cartório) do que aqui do lado, na Argentina, que exige toda uma novela de mandar documentos originais autenticados por sedex para o Ministério das Relações Exteriores em Brasília, esperar o retorno do órgão para somente depois marcar a entrevista no consulado.  
 É esta ignorância dos trâmites que ajudam a seguir adiante e quando você se conscientiza da quantidade de papéis, carimbos, dinheiro para as taxa$ e principalmente, HORAS necessárias para buscar isso tudo aí emu amigo já é meio tarde demais para deixar o desespero bater e mandar tudo às favas.
Eu não desisti por teimosia. Imagina, desperdiçar tantas horas por nada? Nem pensar, agora que já tenho umas 10 horas de livros lidos em filas, bóra buscar aquele papelzinho que você esqueceu de retirar. Ou carimbar.  Ou se certificar de que a data da via está de acordo com o prazo estabelecido pelo consulado.
Esses dias dois amigos disseram ter me visto no centro "saindo do prédio da polícia". É, de vantajoso mesmo só aproveitar as idas e vindas para virar bruxa dos caras. Vai que um dia precise.  
E no mais é confiar que a experiência nos recompense pelos pequenos surtos que a migração nos causa.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Recomeços em liberdade

Ressucitei esse blog. Na verdade não sei se essa é a palavra apropriada, uma vez que abri a conta, postei um texto e por dois longuíssimos anos sequer lembrei que tinha um blog! Jamais divulguei. Não tive comentários porque não tive leitor. Nem pra dizer que eu escrevo mal. Mas hoje resolvi: vou virar blogueira. Vou publicar diveeeersos textos aqui. Falar sobre tudo o que não é pauta, não é notícia e que ninguém jamaáás me pedirá pra escrever.
Mas aí tá o nó da questão: será que eu sei escrever assim...por escrever? Será que eu escrevo como quem bate-papo com o motorista do ônibus, sem pretensões, apenas pelo prazer de trocar umas palavras? Não sei vou descobri do único jeito que uma pessoa teimosa como eu descobre: fazendo.
Vou ficar um pouco nesse universo ver o que rola por aqui no mundo da criatividade. Ou pelo menos, no meu caso, da liberdade. E digo mais: escreverei antes que se completem outros 600 dias.
Talvez eu goste. É isso. Bem-vinda a mim mesma.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Herman Hesse

Não tinha título para o blog. Na verdade foi um momento de tédio na internet que me levou até aqui. Esse título -Teatro Mágico - e o endereço do blog vem de uma referência literária minha, o alemão Herman Hesse. Esse autor é uma espécie de herança familiar (meu pai adora).
O primeiro livro dele que eu li foi Demian. Lembro que detestei. Não entendia como alguém podia passar à vida toda se culpando por ter roubado as maçãs do vizinho. Talvez seja uma metáfora sobre os nossos medos, as nossas culpas, de longe parecerem ridículas. Na segunda vez que li entendi melhor, já gostei.

Depois veio Sidarta, que trata da busca de um homem por uma vida mais plena, pela redenção das culpas. Hesse se inspira certamente em Buda.

Por último li Lobo da Estepe, que meu deixou totalmente paralisada.Achei magistral a maneira com que Hesse fala sobre a angústia do ser humano, sobre solidão, sobre procurar um sentido para a vida e não achá-lo, sobre autodestruição.
A crise de Harry Haller se passa no século XX mas é real para os viventes desse século XXI. Talvez perpasse a existência humana, acredito que sim.
De qualquer modo, eu não estou em nenhuma onda de autodestruição. Mas como Sidarta, e como Haller, na verdade também quero esse "nem se sabe o quê" que todos de algum modo procuram. Alguns são mais felizes na jornada, outros não.
A autodestruição de um personagem e o nirvana e total desapego do outro são duas pontas de um mesmo mal. Talvez o segredo da vida seja o malabarismo - o tal caminho do meio do senso comum. Mas as pessoas tendem a menosprezar o senso comum sem perceber que ele é uma das coisas mais viscerais que há.